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A maturidade poética de Eunice Arruda

Em 1960, com pouco mais de 20 anos, Eunice Arruda publicou seu primeiro livro, É Tempo de Noite, merecendo elogiosas críticas de Péricles Eugênio da Silva Ramos e Luís Martins, no qual se podia entrever sua rara sensibilidade poética, fato comprovado nos 14 livros de poesia e um de contos que viriam a seguir, em mais de cinco décadas de vida literária.

Nascida em Santa Rita do Passa Quatro, no interior de São Paulo, ainda menina mudou-se com a família para a capital paulista, onde se formou em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Para Álvaro Alves de Faria, “tem-se impressão que seus poemas nascem e depois começam a ser lapidados vagarosamente, até que virem uma jóia rara”. E para Carlos Nejar Eunice “lembra o poeta italiano Ungaretti pela síntese. O momento é preso e encantado.” Em 2012, pela editora Pantemporâneo, teve publicada sua Poesia Reunida. Faleceu na capital paulista, em 21 de março de 2017.

Quais as lembranças mais marcantes que guarda dos tempos de Santa Rita do Passa Quatro, sua cidade natal?

As lembranças mais marcantes que guardo dos tempos de Santa Rita do Passa Quatro são as badaladas do sino da igreja matriz, os arbustos do jardim simulando verdes animais, as ruas ainda silenciosas e o grupo escolar. Foi nesse contexto que conheci a poesia: um soneto rimado, metrificado. Foi quando senti que a estranha linguagem da poesia seria senão a única, mas a principal forma de me comunicar.

E a mudança para São Paulo, como se deu?

Na década de 60, vim morar em São Paulo, na Vila Madalena. Na época, um bairro simples, de ruas não iluminadas. Estudei durante sete anos no Colégio Stella Maris, onde conheci a disciplina, me exercitei nas redações de português e conheci a linguagem poética dos evangelhos nas aulas de religião.

Na Antologia dos Novíssimos, de 1961, você escreveu: “Dizer o que sou? Antes, não sei se é justo tocar a chaga aberta mesmo com os próprios dedos”. Mais de cinco décadas depois, é possível definir-se?

Em 1960, publiquei o primeiro livro de poesia É Tempo de Noite, Massao Ohno Editor. Na Antologia dos Novíssimos, realmente disse “como dizer o que sou?”. Após cinco décadas, posso me definir como uma pessoa que perseverou, que não quis sair do caminho escolhido, apesar das dificuldades.

No poema “Culpa”, de As Coisas Efêmeras (Brasil Editora, 1964), temos que “nunca seremos tão humildes / para gastar a vida com / ternura”. Será mesmo este o caminho?

Não sei se esta afirmativa foi realmente autêntica ou não. Porque, como diz Fernando Pessoa, “o poeta é um fingidor”. Ou ainda os poetas não sabem o que dizem e assim serão sempre perdoados.

Desde quando o interesse pelo haicai, a ponto de tornar-se especialista nele?

Coordenando oficinas literárias, na década de 80, senti a necessidade de ensinar para os participantes a concisão. Não exagerar no número de palavras. Enfim, o que se chama de enxugar o texto. Optei então por aprender o haicai que é o máximo grau de concisão. Passei a frequentar o Grupo Haicai Ipê, para sistematicamente exercitar esta poesia de origem japonesa. Então, fui aprendendo, escrevendo e publiquei dois livros de haicai Há Estações (Escrituras Editora, 2003) e Olhar (Dulcinéia Catadora, 2008). Continuei com esses dois tipos de linguagem, a do haicai e do meu próprio estilo, o que venho escrevendo há muitas décadas.

Autores de cabeceira e o que recomenda aos jovens autores?

Ultimamente, estou me dedicando à leitura de textos teóricos referentes à literatura. Aos jovens, recomendo o clássico Cartas a Um Jovem Poeta, de Rainer Maria Rilke.

Sobre os autores da entrevista: Angelo Mendes Corrêa é doutorando em Arte e Educação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (USP), professor e jornalista. Itamar Santos é mestre em Literatura Comparada pela Universidade de São Paulo (USP), professor, ator e jornalista.

 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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