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A tributação dos influencers nas redes sociais

O desenvolvimento das tecnologias da informação, num mundo global, fez surgir novos modelos de negócio, os quais escapam a uma normatividade fiscal clara e direta.

A economia digital, em especial, tem promovido, a passos galopantes, a erosão das bases tributárias e a criação de situações de imunidade fiscal, que importaria evitar, de partida, em nome da sustentação dos sistemas tributários, causando transtorno e preocupação, não só por se traduzir re-ceita tributária cessante, mas, também, por contrariar princípios e outros valores basilares, como o do pagamento dos impostos em função da capacidade contributiva (corolário do princípio fundamental da igualdade).

Os denominados digital influencers são, hoje, um bom exemplo disso mesmo. Trata-se de personalidades, mais ou menos conhecidas do grande público, ou que se tornam conhecidas através das redes sociais e que, nos úl-timos anos, assumiram um papel no palco da divulgação e da promoção de produtos e serviços vários. São mesmo, muitas vezes, verdadeiros intervenientes de publicidade online, uma das manifestações do comércio eletrónico.

As marcas que contactam estes influencers, que gozam, assim, de grande exposição pública e que alcançam um número considerável de consumidores, visam obter lucros por intermédio de instrumentos contratuais ou de meras parcerias mais ocasionais.

É comum os “influenciadores digitais” serem pagos pelos serviços que prestam quer em valores monetários, quer em espécie, como, por exemplo, sucede quando aceitam fazer posts em troca do produto ou do serviço que publicitam. Existem mesmo casos, como os programas de “afiliados”, em que os influencers aceitam receber uma percentagem das vendas que o seu “código”, associado a certa marca ou produto, gera, e, bem assim, outros recebimentos em função do número de acessos à página da marca ou ao produto que os seus posts promovem.

Ser influencer é já uma atividade desenvolvida de forma profissional e que envolve montantes relevantes, pelo que importa compreender de que modo os seus rendimentos são, ou podem ser, tributados em Portugal.

A TRIBUTAÇÃO DOS INFLUENCERS ENQUANTO PESSOAS INDIVIDUAIS EM IRS

Os contribuintes individuais que se qualifiquem como residentes fiscais em Portugal são tributados, em sede de IRS, sobre os seus rendimentos mundialmente auferidos. Já os não residentes são tributados, apenas, sobre os seus rendimentos de fonte portuguesa.

Assim, os influencers que sejam residentes fiscais em território português serão tributados sobre os seus rendimentos portugueses e sobre os de fonte estrangeira, enquanto os que sejam não residentes poderão, ainda assim, ter obrigações fiscais em Portugal, declarativas e outras, caso aqui aufiram rendimentos.

Num caso e no outro, tratando-se de uma atividade aqui desenvolvida, os valores que sejam auferidos pelo influencer podem ser tributados em sede de IRS, sendo possível reconduzi-los ou à categoria A (trabalho dependente) se auferidos no âmbito de um contrato de trabalho, ou à categoria B (rendimentos empresariais e profissionais) se auferidos enquanto profissionais independentes.

Importa clarificar que o que separa um tipo de rendimento do outro é, respetivamente, a existência ou a inexistência de um vínculo contratual que importe a subordinação do prestador, sendo que, uma vez que a maioria dos influencers presta tais serviços a mais do que uma marca e que, em regra, tem liberdade para determinar a forma como publicita e promove o produto ou o serviço que esteja em causa, parece-nos que não haverá, na maioria das vezes, verdadeira subordinação jurídica, pelo que tais rendimentos se devem, regra geral, enquadrar na categoria B.

Tal significa também que estes prestadores de serviços têm a obrigação de registar a sua atividade junto da Administração tributária e de emitir faturas-recibos pelos serviços que prestam, sendo tributados às taxas gerais e progressivas, acrescidos da taxa adicional de solidariedade (até 48% mais 5%) do IRS.

Acrescenta-se que, dependendo do seu volume de negócios, tais profissionais podem ficar sujeitos ao regime simplificado (sendo o rendimento determinado com base em coeficientes) ou ao regime da contabilidade organizada (sendo o rendimento determinado com base nas regras da contabilidade e imputados to-dos os lucros e gastos).

Cumpre salientar que qualquer uma das formas de pagamento mencionadas, incluindo, portanto, as de pagamento em espécie, estão sujeitas a tributação, em sede de IRS, já que o próprio Código prevê a tributação dos rendimentos em valores pecuniários ou em espécie e prescreve métodos de determinação dos montantes a considerar neste último caso.

Não obstante, certos “presentes” podem ficar excluídos de tributação, por terem um valor económico reduzido ou serem considerados “ofertas”, conforme os usos sociais e comerciais.

Mais a mais, dependendo das entidades a quem prestem serviços, nomeada-mente do respetivo local da residência fiscal, os rendimentos poderão ser considerados como de fonte portuguesa ou estrangeira e tais entidades pagadoras dos rendimentos poderão, ainda, estar obrigadas a fazer retenção na fonte em sede de IRS.

A TRIBUTAÇÃO EM SEDE DE IVA

Como acontece com outros prestadores de serviços, os influencers podem, ainda, ficar sujeitos ao cumprimento de outras obrigações fiscais, nomeadamente em sede de IVA.

Efetivamente, nos termos do Código respetivo, só se deverá verificar a isenção em sede de IVA quando a transmissão dos bens se dê de forma gratuita, ou se trate de ofertas de valor diminuto, ou amostras. Nos demais casos, que se deverão qualificar como situações de prestação (onerosa) de serviços, haverá lugar à liquidação e ao pagamento de IVA.

AS CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL

De igual modo, tais profissionais podem ficar sujeitos ao pagamento de contribuições para a Segurança Social, na medida dos rendimentos que aufiram, sendo de referir que, atualmente, a taxa para os trabalhadores independentes encontra-se fixada em 21,4%, que aumenta para 25,2% no caso dos empresários em nome individual e titulares de estabelecimento individual de responsabilidade limitada e seus cônjuges.

O IMPOSTO DO SELO

Por fim, cumpre salientar que, quando as marcas oferecem bens de valor mais ou menos avultado aos influenciadores digitais (como é o caso paradigmático das jóias), se tal transmissão não puder ser considerada como rendimento (em espécie), nem como uma oferta conforme os usos, tal transmissão será tributável em sede de Imposto do Selo, à taxa de 10%.

Nota-se que esta posição se poderia considerar muito controversa, uma vez que, aqui, apenas caberiam situações de verdadeira doação ao influencer, sem que exista qualquer contraprestação (publicidade), tratando-se, portanto, de verdadeira liberalidade, o que, naturalmente, será muito difícil de ocorrer, uma vez que a marca, ao “doar” certo bem, terá sempre um interesse latente e a expectativa de que o influencer o mostre ao (seu) público.

A TRIBUTAÇÃO DAS SOCIEDADES DE INFLUENCERS

Certos influencers optam, muitas vezes, por constituir sociedades (v.g. unipessoais), através das quais prestam os seus serviços, em vez de atuarem como profissionais independentes.

Tal como os contribuintes individuais que se qualifiquem como residentes fiscais em Portugal são tributados, em sede de IRS, sobre os seus rendimentos mundialmente auferidos, as sociedades que sejam residentes fiscais em Portugal (tenham aqui a sua sede ou direção efetiva) serão tributadas, em sede de IRC, sobre os seus lucros mundialmente auferidos.

Para além dos custos com a constituição e a manutenção da sociedade, esta terá, também, de pagar IRC sobre os seus lucros tributáveis (à taxa geral de 21%, acrescida das derramas municipal e estadual e tributações autónomas), determinados com base nas regras da contabilidade.

Com efeito, as sociedades ficam obrigatoriamente sujeitas ao regime de contabilidade organizada, o que implica a existência de, pelo menos, uma conta bancária exclusivamente afeta à atividade, para que não ocorra confusão entre os patrimónios, e necessitam, ainda, de nomear contabilista certificado.

No mais, quando ocorra a transferência de montantes da esfera da empresa para a esfera da pessoa singular, seja por intermédio de um contrato de trabalho (categoria A), seja pela distribuição de lucros (categoria E), tais rendimentos serão tributados em sede de IRS, na esfera do contribuinte individual, de-vendo a empresa cumprir, também, as suas obrigações declarativas de retenção na fonte.

Adicionalmente, caso se verifiquem certas características, a Administração tributária poderá desconsiderar a estrutura societária e imputar diretamente ao sócio esses rendimentos, no âmbito do regime da transparência fiscal, previsto pelo Código do IRC, assim tributando esses valores na esfera do sócio (no âmbito da categoria B do IRS).

Importa referir que, no caso do profissional independente, o património pessoal e o do “negócio” são o mesmo, respondendo aquele pelas dívidas contraídas por este último. Contudo, no caso das sociedades unipessoais por quotas, a responsabilidade do sócio (único) fica limitada ao montante do capital social, o que importa um maior risco para os respetivos credores.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em suma, em Portugal, os influenciadores digitais estão sujeitos a tributação, em sede de IRS, na sua esfera pessoal, pelos rendimentos que aufiram da sua atividade, seja em valores pecuniários ou seja em bens.

Caso optem por constituir uma sociedade, esta ficará também sujeita a tributação em sede de IRC e os rendimentos que distribuir (salários ou dividendos) ao respetivo sócio, ficarão, também, sujeitos a IRS.

De uma forma ou de outra, estes profissionais não ficam isentos de tributação, tendo a obrigação de suportar impostos na medida da sua capacidade contributiva.

Com efeito, caso ocultem esses rendimentos, a Administração tributária dispõe de mecanismos para controlar situações tributárias anómalas, incluindo de natureza contraordenacional e criminal, como é o caso dos mecanismos de tributação de manifestações de fortuna e de acréscimos patrimoniais não justificados, baseados em métodos de avaliação indireta.

Em tais casos, o legislador transfere o ónus da prova para a esfera do contribu-inte, que terá de demonstrar que não auferiu os rendimentos que a lei permite que a Administração presuma.

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Lisboa, 19 de agosto de 2021

Rogério M. Fernandes Ferreira
Filipa Gomes Teixeira
Duarte Ornelas Monteiro
Joana Marques Alves
Raquel Cabral Duarte
Yasser Tavares Vali

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