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Lições do Dia de Portugal na Suíça

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O Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas foi este ano celebrado oficialmente em Genebra, Berna e Zurique. Como sempre, é uma oportunidade para exaltar Portugal e os portugueses dispersos pelo mundo, que é uma forma de reconhecimento da sua importância para o país. Por celebrarmos também os 500 anos do nosso grande poeta épico, este ano Luís de Camões teve um destaque especial, pelo humanismo e universalismo que tão bem caracteriza a sua vida e obra.
Mas estes valores estão hoje rudemente postos à prova com a ascensão da extrema-direita em Portugal, com tudo o que representa de regresso ao passado e negação dos valores humanistas e universalistas que dão identidade ao povo português, que sempre foi respeitado em todo o mundo pela sua capacidade para criar laços com todos os povos, culturas e religiões.

Nas suas intervenções, além de ter registado as preocupações da comunidade, sobretudo as que se prendem com temas fiscais, o Presidente da República procurou puxar pelo nosso orgulho e amor próprio, dizendo e repetindo que somos os melhores do mundo. Compreende-se que o faça, porque a autoestima dos portugueses tem caído muito desde o aparecimento do Chega, que tem usado uma retórica falsamente patriótica. 

Com efeito, não se pode jurar amor pela nação e sistematicamente dizer que somos os piores do mundo, que todos são corruptos e, portanto, sem ética nem valores, como se vivêssemos em decadência moral e o país vivesse em desorganização e incompetência insanável. 

Deste tipo de discurso sombrio só pode nascer um sentimento de depressão e desgosto, por não sermos como os mais evoluídos do mundo e como se todos fossem virtuosos menos nós. E também porque, com esta retórica doentia, se ignorar e desvalorizar tudo o que de positivo o país e os portugueses têm feito ao longo da sua história democrática. Além disso, contribui ainda para degradar a nossa imagem externa, que obviamente afeta também os portugueses que vivem na diáspora. 
Quando  a extrema-direita portuguesa ataca soezmente as primeiras figuras da República e as suas instituições democráticas, está também a provocar a perda de confiança que devem merecer e, ao usar para se afirmar politicamente a retórica contra os estrangeiros, está a destruir os valores que mais distinguem o povo português, o humanismo e universalismo, visível no facto de nos entendermos bem com todos os povos.

Aquilo que a extrema-direita tem trazido para Portugal é, por isso, a destruição desta capacidade de sermos empáticos com outros povos, de os aceitarmos e acolhermos com a generosidade, a mesma com que queremos que os portugueses que emigram sejam acolhidos e respeitados.

E a Suíça é, por isso, um país excelente para celebrar o Dia de Portugal junto da nossa comunidade. É que, ainda não há muito tempo, o Chega ganhou neste país as eleições legislativas e agora as europeias, embora neste caso quase empatado com o PS e com o AD. Mas não deixa de ser paradoxal que os emigrantes portugueses, que muitas vezes sofrem na pele a discriminação das políticas da extrema-direita, incluindo na Suíça, devido à preferência nacional que impera desde a última alteração à lei da imigração, apoiem um partido com um líder que se compara a Salazar e que trata os estrangeiros como cidadãos de segunda, gerando um racismo e uma xenofobia a céu aberto, que é contrário aos valores que fazem parte da nossa identidade mais profunda e que devemos preservar. O facto de haver problemas que afetam os portugueses na Suíça, que devem obviamente ser levados em conta, não pode explicar tudo. É preciso combater os falsos patriotismos e os justicialismos para que a nossa democracia possa respirar. E defender aquilo que melhor nos caracteriza como povo: sermos abertos, acolhedores e humanistas e não fechados e xenófobos, como é mais visível desde que os extremistas se passeiam sem vergonha em Portugal. 

Paulo Pisco 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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