Foi com uma pequena cotovelada que eu acordei o amigo de S. Tomé. Não que ele estivesse a dormir, mas porque deixara o corpo connosco naquela aula de trabalhos manuais, para deambular com o pensamento sabe-se lá por onde.
O Raúl acabara de contar uma pequena história.
“Eh pá… desejo-te que vivas tantos anos quantos palmos tem a ponte 25 de Abril – disse-lhe o meu pai.”
E se a piada por si só não fosse motivo para tanta risota mas alguma, a maneira entusiástica com que o Raúl a contou, foi.
Como o amigo de S. Tomé continuava imóvel, de boca entreaberta, não se sabe se para deixar escapar o que quer que lhe fosse no pensamento, ou para deixar entrar algo naquela cabecinha vazia, ao verificar que ele finalmente acordara com a minha cotovelada, eu disse-lhe.
– Este rapaz está talhado para o sucesso, olha para o que eu te digo.
E dessa memória do ano de 1977, só me lembro de o amigo de S. Tomé abrir a boca de espanto, para logo de seguida desatar uma gargalhada de socorro, à espera de compreender o porquê de se estar a rir.
Quando no sábado passado, 23 de Novembro de 2024, o Raúl Reis abria oficialmente o Portugal+ (leia-se Portugal Positivo), na sala Lisboa, do Pestana Chelsea Bridge Hotel, lembrei-me desse longínquo dia na sala de trabalhos manuais, na escola preparatória Manuel Faria e Sousa, em Felgueiras.
Do sucesso do Raúl Reis já eu tinha tido a prova daquilo que previ há muitos anos. Da maneira como o nosso amigo de S. Tomé deixou cair os queixos na carteira, para depois a língua desenrolar como uma meia de futebol até ficar esticada, isso já é a memória a deixar-se influenciar pelo brilhante Jim Carey e a sua mestria como ator, que com a ajuda de técnicos de efeitos especiais, fazem o impossível ficar possível.
Que o diga o nosso Tiago Faria, técnico de efeitos especiais, presente no evento, e que na sua ainda curta carreira tem já uma nomeação para o Primetime Emmy Awards.
Foi a primeira vez que eu participei no Portugal+, este ano realizado em Londres.
O evento contou com a participação de várias entidades ligadas à política, às artes, aos negócios, saúde, à música e aos media.
Foi, para mim, uma experiência muito interessante e bastante positiva.
Não só tive a oportunidade de rever o amigo Raúl Reis, recordar bons momentos do passado, como tive também a honra de conhecer pessoalmente a São Gonçalves, para mim, e para muita outra gente também, das melhores poetisas da atualidade.
Foi um fim de semana muito proveitoso e ao mesmo tempo excelente, para trocar algumas ideias, ou apenas conhecimentos.
Políticas à parte, porque aqueles que me ouviram na minha intervenção no painel da cultura da diáspora, sabem que há duas coisas sobre as quais eu não escrevo: política e futebol. Foi no entanto, uma honra, mas acima de tudo um enorme prazer, que conheci o deputado Paulo Pisco, reeleito pelo círculo da Europa nas últimas legislativas.
Pessoa inteligente, com um enorme conhecimento dos desafios das comunidades portuguesas, homem bastante acessível nas suas conversas e na sua interação com toda a gente.
O evento contou também com uma mensagem do senhor Presidente da República Marcelo Rebelo de Sousa.
Depois de já ter participado noutras edições prévias deste evento, Marcelo Rebelo de Sousa, que por motivos de agenda não pode estar presente, congratulou-se pela chegada do Portugal+ ao Reino Unido, organizada pelo BOM DIA, lembrando o associativismo português além-fronteiras, e sublinhando a importância de destacar o potencial da nossa diáspora e também a colaboração entre as diferentes redes dessa diáspora.
Foi de facto um evento bastante diverso, não só de participantes, como também de vários temas que de uma ou outra maneira dizem respeito às comunidades da diáspora espalhadas pelo mundo.
Manuel Grainha do Vale, Cônsul-Geral de Portugal em Londres no seu discurso prometeu um consulado aberto às comunidades.
Sara Madruga da Costa, Adjunta do secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, José Cesário, anunciou que o passaporte português vai passar a ter 10 anos de validade.
José Dias Fernandes, deputado do Chega eleito pelo círculo da Europa defendeu que as comunidades portuguesas continuam esquecidas pelo governo central e que a diáspora portuguesa não pode ser apenas uma mais-valia financeira para o governo.
Paulo Pisco afirmou, e explicou o que acabara de afirmar, “O Orçamento do Estado não traz nada de novo para as comunidades”.
Como eu prometi que não falo de política, quem quiser saber a explicação que vá à página do BOM DIA.
Jorge Madeira Mendes, antigo tradutor da comissão Europeia afirmou na sua intervenção que “A língua portuguesa está a ser duramente atacada na sua própria pátria”.
O evento Portugal + teve como anfitrião o professor doutor Ivandro Soares Monteiro, também ele um ativo colaborador do BOM DIA.
Naquele ano de 1977, algures na sala de trabalhos manuais, no antigo edifício do ciclo preparatório Manuel Faria e Sousa, à distância de quase 47 anos, ninguém poderia imaginar que Londres haveria de chamar, para um evento que iria despoletar a memória desse preciso momento.
Este texto é apenas para lembrar esse momento de 1977 e não para falar do evento Portugal+…
António Magalhães