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O trabalho mata ou fortalece?

Em Tempos Modernos, um operário hilário, encarnado por Charles Chaplin, acaba desenvolvendo uma compulsão doentia, para apertar tudo que fosse semelhante a um parafuso, resultado do processo contínuo e mecanizado da linha de montagem fordista. O filme mostra a maximização da produtividade e do lucro, o ambiente controlado, a insegurança do desemprego, a vulnerabilidade do trabalhador perante as condições de trabalho, que levou o operário à doença. Passados oitenta e três anos, continuamos a adoecer e a morrer devido ao trabalho. O custo anual para a economia global, devido aos acidentes e doenças relacionadas ao trabalho é US$ 3 biliões, segundo a Organização Internacional do Trabalho. Mais de 2,3 milhões de trabalhadores morrem a cada ano como resultado de acidentes de trabalho ou doenças relacionadas ao trabalho. 3,2 mil milhões de trabalhadores do mundo estão cada vez mais doentes, sendo que a grande maioria é por ter de lidar com a insegurança económica significativa: 77% trabalham em empregos part-time, temporários, “vulneráveis” ou não remunerados. Apenas nos Estados Unidos, estima-se que o custo anual de US$ 300 mil milhões esteja relacionado ao stress, e US$ 550 mil milhões relacionados ao desinteresse (no sentido de insatisfação) no ambiente de trabalho, segundo relatório da Global Wellness Institute.

Os números são alarmantes, quando pensamos que passamos uma grande parte do nosso tempo no trabalho, e quando sabemos que é vital uma força produtiva saudável para o bem-estar social, empresarial e do país. Este é um jogo que todos perdem. Como uma pescadinha de rabo na boca, a roda retroalimenta-se. Funcionários insatisfeitos, baixa criatividade, mau ambiente de trabalho, aumento de rotatividade, subsídio de doença, reformas antecipadas, geram perda de produtividade e custos diretos e indiretos às empresas e ao Estado. A carga laboral excessiva, pressão constante por objetivos, concorrência interna, desmotivação por micromanagement, entre outros factores, geram stress prolongado. O stress leva a subida do cortisol, o que gera consequências físicas, emocionais e psicológicas diretas, entre outras, perda de memória, AVC, doenças cardiovasculares, falta de sono, ansiedade, descontrole emocional, uso de álcool e de medicamentos psicotrópicos, problemas familiares e sociais, depressão, burn-out e morte. Estes são custos pessoais, familiares e sociais de um trabalhador. Uma pessoa stressada, não afeta apenas a ela mesma. Emoções à flor da pele geram problemas familiares, sociais, um ambiente profissional destrutivo com colegas, e no fim, uma sociedade doente. Somos animais sociais, e o nosso estado psíquico, influencia os nossos comportamentos, que por sua vez afetam os outros, o nosso estilo de vida, e o nosso ambiente.

Paralelamente às ações de sustentabilidade económica, ecológica, política, cultural, social que contribuem para a vida humana, é importante traçar estratégias, objetivos específicos e implementar medidas que visam a sustentabilidade humana, uma responsabilidade de todos, para a melhoria da qualidade de vida profissional do ser humano.

Mas afinal o trabalho nos fortalece?

Um estudo de 2016, com cerca de 3.000 pessoas, publicado no Journal of Epidemiology and Community Health, relatou que trabalhar mais um ano, após a idade da reforma, estava associado a um decréscimo de risco de morte de 9% a 11%, e a um aumento da longevidade, independentemente do estado de saúde da pessoa.

Um estudo de 2015, com 83.000 idosos (realizado durante 15 anos), publicado na revista Preventing Chronic Disease, do CDC, relatou que, as pessoas que trabalhavam após os 65 anos, tinham três vezes maior probabilidade de relatar boa saúde em comparação com aqueles que estavam reformados.

Trabalhar está ligado a ter um propósito, servir aos outros, e saber que produz algo para a sociedade, o que nos fornece um sentimento de utilidade, melhora a nossa autoestima, senso de contribuição, e nos dá significado à nossa vida. Pelas mesmas razões, estudos mostraram que reformados que trabalhavam com voluntariado tinham extensão nos anos de suas vidas.

E não somente o trabalho, em si, tem impacto no nosso tempo de vida, como também, as relações que estabelecemos com as pessoas no nosso trabalho. A investigadora Sharon Toker e seus colegas da TAU, Universidade de Tel Aviv, juntamente com a Clalit Healthcare Services, acompanharam os registros de saúde de 820 adultos com idades entre 25 e 65 anos. Eles controlaram vários fatores de risco psicológicos, comportamentais, fisiológicos, como tabagismo, obesidade e depressão, e aplicaram um questionário aos participantes que eram de uma ampla variedade de áreas profissionais. Aqueles que relataram ter baixo apoio social no trabalho, tiveram 2,4 vezes maior risco de morte, em algum momento, nesses 20 anos. A maioria dos 53 participantes que morreram, tinha conexões sociais insignificantes com os seus colegas de trabalho. A falta de apoio emocional no trabalho levou a um aumento de 140% do risco de morte nos próximos vinte anos, em comparação com aqueles que relataram ter apoio dos colegas.

Um ambiente de trabalho amigável e um relacionamento positivo com os seus colegas de trabalho, não somente contribui para um ambiente mais prazeroso, motivador, criativo, mas também traz benefícios de saúde a longo prazo.

Embora o trabalho seja importante fonte de realização para o ser humano, é necessário identificar e mudar algumas patologias organizacionais, e uma delas, é a falsa ilusão que excesso de horas de trabalho traz benefícios à empresa. Um estudo conduzido pelo professor de economia John Pencavel, da Universidade de Stanford, demonstrou que a produtividade, por hora, diminuía acentuadamente quando uma pessoa trabalhava mais de 50 horas por semana. Este estudo soma-se a outros que transmitem que quanto mais horas você trabalha, menos produtivo se torna. Ao contrário, num experimento de 8 semanas, a empresa neozelandesa Perpetual Guardian, deu aos seus 200 funcionários mais um dia de folga semanal, enquanto todas as condições de pagamento e emprego permaneceram inalteradas. O resultado foi que os trabalhadores eram 20% mais produtivos e muito mais felizes.

Portanto, o trabalho pode matar ou prolongar a nossa vida. Ele pode ser fonte de doença ou de saúde, de dor ou de prazer, de felicidade ou de amargura, de ineficácia ou de produtividade, de superação de dificuldades, ou de aumento de problemas. Cabe a todos nós, Estado, empresa, cidadão, mudar com medidas objetivas para uma sustentabilidade humana.

Karina M. Kimmig

Karina M. Kimmig foi galardoada Top Coach na Alemanha, autora do livro “Metodologia Humanística: Os Sete Poderes que Todos Nós Possuímos”, General manager MORE Institute GmbH, Presidente de associações internacionais, cocriadora da MORE Humanistic Methodology, autora, blogger, e referência internacional em desenvolvimento humano. Mais: https://more-institute.com/

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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