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Sandro Borelli: o corpo laico e anárquico na dança

Coreógrafo, professor, diretor e fundador da Cia Carne Agonizante, presidente da Cooperativa Paulista de Dança, idealizador da revista Murro em Ponta de Faca, Sandro Borelli tem percorrido o Brasil, a América Latina, os Estados Unidos e a Europa com seus premiados espetáculos, há mais de duas décadas.

Quando a descoberta da dança?

Descobri a dança quando tinha 17 anos.

Como se dá a influência do teatro em seu trabalho?

Foi de maneira intuitiva, queria ser artista, a minha primeira opção recaiu no teatro, fiz alguns cursos, mas logo percebi que precisava de ações de maior fisicalidade. Na primeira vez que fiz uma aula de dança, percebi que tinha encontrado minha forma de expressão.

Certa vez, você afirmou que a arte o salvou de se transformar num reacionário. Em que sentido a arte liberta o homem?

Até a minha adolescência, tive uma educação escolar medíocre e conservadora, com pouca visão libertadora de mundo. Tinha todas as condições para me tornar um cidadão boss taurus, rumo ao abate civilizatório. O ambiente artístico me proporcionou um conhecimento que, infelizmente, uma pequena parcela da população tem acesso. A arte tem um potencial gigantesco na formação do indivíduo pleno, pois potencializa a reflexão, o pensamento crítico e a cidadania plena. Não digo que liberte o homem, mas oferece caminhos essenciais para isso.

Quais influências no campo da dança e do teatro considera definitivas em sua formação?

Não tive influências determinantes na minha formação, mas, de alguma maneira, todas que pude vivenciar fizeram parte de forma positiva para o meu arcabouço artístico.

Tem um único processo para construção dos espetáculos ou a cada novo projeto ele se altera?

Sigo um processo único, não abro mão disso.

A que se deve sua predileção em trabalhar com profissionais não treinados em técnicas de dança?

Me encanta, porque os movimentos entendidos e produzidos por esses corpos se apresentam de maneira mais original. Para mim, é fundamental.

As exigências físicas tornam, no mais das vezes, curta a carreira de um profissional da dança. No entanto, exemplos como Kazuo Ohno e Angel Vianna vão em sentido contrário. Como explicar isso?

Talvez a genética possa explicar. Também devemos levar em conta como eles exigiram de seus corpos em suas carreiras.

Como define a dança contemporânea?

Uma mistura de pensamentos, modos de ver e compreender o mundo. Deus e o Estado devem estar mortos para que um corpo laico e anárquico surja.

As políticas públicas de apoio à dança no país têm dado conta das demandas? Algo a fazer para aprimorá-las?

Não! A produção da dança brasileira é gigantesca e extremamente diversa. Temos uma lei de Fomento à Dança na cidade de São Paulo que se tornou um marco histórico no país, pois deu mais condições financeiras para o artista aprofundar em suas pesquisas. Leis de incentivo vindas do governo estadual estão sendo desmontadas, gradativamente. No âmbito federal, é um ambiente de terra arrasada, por conta do projeto político de teor neofascista e genocida implementado por Jair Bolsonaro, além de perseguir artistas que se opõem a seus métodos.

Os prêmios que recebeu ao longo da carreira têm significado especial?

Agradeço quem me concedeu os prêmios, mas não tem nenhum significado especial, apenas constam em meu currículo, nada além disso. Não vão postergar minha existência por aqui e não têm significado nenhum rendimento financeiro a mais para mim (rs).

Pode nos contar um pouco de sua atração por Franz Kafka?

Acho que está mais ligada ao suprassensível ou à intuição, logicamente potencializado pela arte.

Projetos de novos em andamento?

Este ano tem sido muito produtivo, apresentamos Konstituição – Ré em Segunda Instância, um projeto que iniciei em 2016. Acabei de estrear MR-8, inspirado em Carlos Lamarca e Iara Iavelberg, guerrilheiros mortos pela ditadura militar brasileira. Para o ano que vem, pretendo criar mais um Kafka, chamado Pequena Fábula.

Sobre o autor da entrevista: Angelo Mendes Corrêa é doutorando em Arte e Educação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (USP), professor e jornalista. Itamar Santos é mestre em Literatura Comparada pela Universidade de São Paulo (USP), professor, ator e jornalista.

 

Esta publicação é da responsabilidade exclusiva do seu autor.

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